quarta-feira, 20 de maio de 2015

2h50 da manhã

O zé dá sinal, faz barulhinhos e acorda.
Antes que ele desperte pego nele e meto-o à mama, como faço todas as noites tantas vezes quantas as que ele pedir há já 9 meses e picos.

Mama, vai fechando os olhos, mama, e vai-se aninhando. Volta a fechar os olhos e larga a mama, mas em vez de ficar a dormir, como faz todas as noites, desperta, abre os olhos e quer que eu corresponda. Estou zonza de sono, deito-me ao lado dele e finjo que estou a dormir, pode ser que o engane, mas não engano.

Dou-lhe mais mama, embalo-o com a mama, mas não é isso que ele quer, pelo menos nesta noite. Olho ao relógio e já passou uma hora, o que normalmente demora 20 minutos, nesta noite já vai numa hora completa.
Começo a ficar zangada, cansada, e falo com ele, calmamente. Mas o cansaço é maior que isso, e falo com ele de modo rispido, ele olha para mim como que a perguntar "o que foi?" e eu olho para ele e quando vou para responder ainda mais zangada penso em ti, amiga, e caio em mim.

Que egoísta que eu estava a ser, que feia.
Tu, amiga, davas tudo para daqui a uns meses estares a passar umas horas em branco com a tua Alice nos braços, em vez disso estavas naquele momento a embala-la pela ultima vez no teu ventre.

Levanto-me, trago o Zé ao colo para a sala, e no escuro coloco musica e danço com ele nos braços.
Fecho os meus olhos e contigo no pensamento, deixo de estar zangada. O Zé adormece, mas eu continuo a dançar. São quatro e meia da manhã, estou cansada, mas já não estou zangada.
Estou grata à vida, às noites sem dormir, aos resmungos de cada um, às más caras, às madrugadas em branco.

Tu amiga, Mãe de coragem, davas tudo para ter a tua Alice nos braços e embala-la, mas quis o Universo que fosse o contrário. O teu sono será daqui para a frente velado por ela, será a Alice a embalar os teus sonhos e a te dar a força e vida que precisas. A Alice estará sempre em ti, para te apaziguar.
Tu deste-lhe a vida e respeitaste a sua partida, foste coragem, foste respeito, foste gratidão, foste Mãe.

O Zé voltou a acordar, já o sol brilhava, peguei nele, dei-lhe de mamar e assim fiquei a pensar em ti, em vós.

Tal como tu transcreveste.

"Uma loba matou um dos seus filhotes que estava mortalmente ferido. Para mim foi como uma dura lição sobre a compaixão e a necessidade de permitir que a morte venha aos que estão morrendo."
MULHERES QUE CORREM COM OS LOBOS

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